O estágio da escrita: problemas de redação no Ensino Fundamental e uma proposta de intervenção com texto literário

 

Marcelo Rodrigues de Moraes

 

Introdução

O presente artigo é um relato das atividades realizadas durante o período de estágio no Ensino Fundamental referente à disciplina Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa I, da Faculdade de Educação da USP, ministrada pelo Prof. Dr. Valdir Heitor Barzotto. Foram acompanhadas 40 horas de observação e 20 horas de regência em quatro oitavas séries de uma escola estadual na cidade de Jundiaí, focalizando as atividades de redação propostas pela professora e as dificuldades de escrita apresentadas pelos alunos.

Os obstáculos mais evidentes nas redações analisadas foram ortografia, sintaxe e níveis de coesão e coerência, “problemas” que se agravaram à medida que o tamanho do texto aumentava. A influência da oralidade na redação dos alunos também foi um tema de destaque, já que a grande maioria transcrevia as palavras da maneira como as falava. Uma possibilidade de intervenção foi a criação de uma atividade de “júri simulado” a partir de um conto de Machado de Assis, que não apenas propiciou um contato com o texto literário, mas também permitiu a criação de pequenas peças teatrais em grupos e um trabalho de escrita com texto argumentativo.

 

Estágio de observação (diagnóstico)

O período de observação na sala de aula das quatro oitavas séries foi bastante tranqüilo e proveitoso. Os alunos aceitaram minha presença e a professora constantemente pedia minha opinião e intervenção durante as atividades.

Percebi que quase todo o tempo das aulas era utilizado para explicação de conteúdo gramatical e que os alunos perdiam o interesse com freqüência; poucas vezes estiveram em contato com a leitura de textos literários. Questionada sobre o assunto, a professora respondeu que procurava fugir do tema “literatura” por não se sentir segura em ensiná-lo e por acreditar que os alunos não tinham condições de ler e compreender um texto elaborado; ou seja, ela subestimava sua própria capacidade pedagógica e a capacidade dos alunos de apreciarem a interação com a literatura e utilizarem esse tipo de texto para melhorar sua própria escritura. É inegável que a base para a valorização dos direitos humanos está na educação, e o direito à leitura não deve ser privilégio de um grupo favorecido. Nas palavras de Antonio Candido (2004:186) “negar a fruição da literatura é mutilar a nossa humanidade”, pois é um importante instrumento que pode contribuir para a formação humana.

Depois de identificar que a leitura de textos se tornava um obstáculo em sala de aula e era evitada, a professora me entregou algumas produções escritas que os alunos haviam feito para eu corrigir e avaliar. A partir do primeiro contato com as redações, foi possível identificar várias ocorrências que não são esperadas para estudantes da oitava série do Ensino Fundamental, dentre as quais se destacaram problemas de traçado (os alunos não respeitavam margens e linhas), ortografia, sintaxe, concordância e níveis de coesão e coerência.

A gravidade da situação se intensifica com a dificuldade encontrada pela grande maioria dos alunos em escrever palavras e orações simples. O próximo parágrafo apresenta e comenta alguns dos problemas encontrados em resolução de exercícios sobre classificação de Orações Subordinadas e Coordenadas.

Os exemplos, retirados do caderno de um aluno, mostram erros de ortografia cometidos durante a cópia do enunciado do exercício, escrito de maneira correta na lousa. Em negrito, temos a forma como o aluno redigiu a palavra e entre parêntesis a forma como a professora a escreveu: rescebeu (recebeu) apartir (a partir), classificalo (classificá-lo), defendelo (defendê-lo), advinhou (adivinhou), márcia (Márcia), felipe (Felipe), sentil (sentiu), comsulta (consulta), centimento (sentimento), discubriram (descobriram), auguns (alguns). A partir dos exemplos, é possível concluir que a forma como a matéria era passada à classe não atraía a atenção dos alunos, que nem mesmo conseguiam se concentrar na cópia da lousae, pior que isso, copiavam de maneira equivocada sem perceber.

Preocupado com essas ocorrências, decidi aplicar uma atividade que fizesse com que os alunos treinassem leitura, interpretação e escrita. Durante o início do período de regência (que será descrito mais adiante), a professora pediu que eu aplicasse uma prova sobre o conto escolhido. Perguntei se não seria mais adequado aplicá-la depois que a atividade de “júri simulado” estivesse concluída, mas ela preferiu que a avaliação estivesse no começo, após a leitura do conto que sugeri. As transcrições que aparecem a seguir são trechos dos textos redigidos pelos alunos no início da atividade preparada para o período de regência, ou seja, representam ainda um momento inicial de contato com o conto e revelam problemas esperados, tendo em vista as produções anteriores.

Resposta da questão quatro da prova escrita sobre o conto “A Cartomante”, de Machado de Assis.
“Sim, com o ódio que vilela (Vilela) sentiu do meu amigo Camilo deve ter anos e algum lugar porque antigamente eles eram amigo inseparavel (amigos inseparáveis) (ausência de pontuação) mais quando a Rita se apresentou ele deve ter tido siumes (ciúmes)”.

Resposta da questão um da mesma prova escrita.
“Prencentimento (pressentimento). Axo (acho) que ele teve um presentimento (pressentimento) por isso foi à cartomante”.

Resposta da questão três da mesma prova escrita
“Que li (ele) deijou (deixou) mês (mais) confiante feliz ló (ausência de pontuação) Tirou a angútia (angústia) do Peito (peito)? ela (Ela) errou pois Vilela já sabia de tudo? camilo (Camilo) (ilegível) Pronto Para (pronto para) [ilegível] Vilela mas ja (já) esteve longe o medo da descoberta”.

As expressões e palavras em negrito apontam as correções necessárias aos textos. A presença da oralidade na escrita desses alunos mostrou-se evidente nas reduções de vogais, como em “discubriram”, onde a vogal /e/ foi reduzida a /i/ e a vogal /o/ reduzida a /u/, fato muito comum na língua falada. A vocalização da consoante lateral /l/ também ocorreu com freqüência, como na palavra “auguns” presente na avaliação de um dos alunos. O caminho inverso também apareceu na troca da vogal /u/ pela lateral /l/ na palavra “sentil”. O uso de pronomes pessoais do caso reto na função de objeto direto, também típico da língua falada, mais próxima da linguagem usada pelos alunos no cotidiano, apareceu em “encontraram ela”.

Os problemas com a pontuação também foram evidentes; o último trecho transcrito acima foi retirado da avaliação de um dos alunos que escreveu todas as respostas sem um ponto final sequer. Esse trecho parece ser o que contém mais problemas e a influência da língua oral na redação do aluno é o traço que chama a atenção. A não-diferenciação entre os sistemas lingüísticos escrito e falado, que têm regras distintas, faz com que muitos dos alunos tentem transcrever aquilo que falam da maneira como falam. Entretanto, todos os trechos transcritos acima são passiveis de compreensão (com exceção do último), mesmo que em algumas passagens ocorra ambigüidade devido a desvios da norma padrão da língua.

Como observei, alguns alunos copiavam as palavras que não tinham relação entre si de maneira aleatória; algumas respostas dadas às questões evidenciam o fato de que vários alunos podem ser considerados “copistas” (copiam as palavras sem entender o que estão escrevendo). Outra situação que merece destaque é o fato de que os alunos se sentavam em duplas e emprestavam os cadernos para que os colegas que tinham mais dificuldade copiassem as respostas.

Os textos de dois alunos eram praticamente incompreensíveis e só mais tarde a professora revelou que eles eram ‘analfabetos' e apenas sabiam escrever o próprio nome. Segundo ela, os dois eram preguiçosos e não tinham vontade de fazer os exercícios dados em aula; concluí que, na verdade, eles não os faziam por uma razão óbvia – total impossibilidade – e até sentiam um certo preconceito por parte dos outros estudantes. Identifiquei que os dois conseguiam escrever e ler algumas palavras, mas dificilmente diferenciavam ‘-ss‘ de ‘-s' ou ‘-ç', não sabiam quando empregar ‘-r' ou ‘-rr', e tinham dificuldades de colocar as vogais ‘-e' e ‘-i', empregando-as de maneira aleatória. Ao perguntar para a coordenadora pedagógica sobre o caso dos dois alunos, ela afirmou ter conhecimento do assunto e também disse que eles não eram os únicos que não sabiam escrever. Em menores graus, havia vários estudantes com dificuldades, além de alguns que não admitiam o próprio problema (ou os pais não o queriam admitir), tornando a busca por uma solução um processo ainda mais complicado.

Para tentar minimizar a situação problemática encontrada no período de observação e também para inserir um conteúdo literário em sala de aula e trabalhar com leitura, interpretação e redação, desenvolvi a atividade de júri simulado no período de regência, que será descrita e explicada a seguir.

 

Estágio de regência (tratamento)

As atividades de regência foram desenvolvidas nas quatro salas de oitava série acompanhadas durante a observação; algumas das regências foram feitas de total improviso, já que uma simples intervenção se transformava em uma aula com explicações de conteúdo (gramatical, em grande parte); mas, na maioria das vezes, a aula da professora era interrompida nos primeiros minutos da aula para o início da minha regência programadas.

Na primeira aula em que atuei como professor, expliquei aos alunos as características principais da crônica, comentando que algumas das redações que eles haviam escrito no período de observação se encaixavam perfeitamente no gênero que é marcado por textos breves e de temas do cotidiano. Uma das primeiras explicações que fiz foi sobre a diferença entre linguagem formal e linguagem coloquial, que apareciam no livro didático como elementos da crônica. Os alunos faziam perguntas curiosas, como, por exemplo “a gente fala como escreve ou escreve como fala?”, e eu prontamente respondia que não. Os alunos confundiam os dois tipos de linguagem, identificando-as com dificuldade. A oportunidade de comentar as principais diferenças se deu com maior ênfase nas aulas dedicadas à atividade de “júri simulado” sobre o conto “A Cartomante”, de Machado de Assis.

Uma dúvida constante dos alunos era se podiam escrever “tudo certinho” ou podiam escrever abreviado. Expliquei-lhes que cada texto tem as suas particularidades e características próprias e que cada linguagem era usada em um contexto diferente. Os marcadores conversacionais e a hesitação próprios do texto falado haviam sido identificados nas provas corrigidas. Porém não foram feitas grandes explicações teóricas sobre os conceitos que envolvem os dois tipos de linguagem, tampouco foram passados nomes como “marcadores conversacionais” ou “hesitação”, visto que a análise de textos orais não era o ponto principal da aula.

Na escrita das provas anteriormente comentadas, a grande maioria da sala utilizou a linguagem abreviada, típica das salas de bate-papo e dos programas de mensagens instantâneas da Internet. A recorrência de algumas palavras foi discutida com a classe e abreviações como, por exemplo, “tb”, “vc”, “hj”, foram escritas na lousa e desenvolvidas e comentadas pelos alunos. Quando perguntados sobre as ocasiões em que escreviam daquela maneira, a resposta foi unânime: na Internet. A finalidade de abreviar as palavras e omitir os acentos em muitos casos, segundo os alunos, é diminuir o tempo utilizado na digitação para que a conversa flua mais rápido. Perguntei a eles se as respostas que colocaram nas provas analisadas pareciam mais com a linguagem falada ou a escrita e a sala ficou em silêncio. Em seguida, de maneira muito tímida, os alunos disseram que várias “coisas” pareciam muito com a linguagem utilizada no computador.

O trabalho que desenvolvi na parte final da regência consistiu na criação de um “júri simulado”, feito em grupo de cinco alunos, para ser apresentado em sala, com a colaboração de todos. Consistiu basicamente na elaboração de uma breve peça de teatro, a partir da leitura e interpretação do conto “A Cartomante”, de Machado de Assis.

O trabalho, que durou aproximadamente sete aulas, teve início com a leitura do conto em voz alta. Para isso, vários alunos se alternaram nas funções de narrador e personagens. Em seguida, tirei as dúvidas de vocabulário que surgiram, fiz uma nova leitura em voz alta e pedi para que eles me contassem o que tinham entendido do conto. Passada essa fase inicial do primeiro contato com o enredo, os alunos se dividiram em grupos de cinco pessoas, cada um indicado para as seguintes funções: um advogado de defesa, um advogado de acusação, uma testemunha de defesa, uma testemunha de acusação e um juiz. Expliquei que eles deveriam criar um texto curto para apresentar em sala, com diálogos de todas as personagens, simulando a defesa/acusação da figura virtual de Vilela, personagem do conto que matou a esposa e o melhor amigo. Avisei-lhes que não deveriam se preocupar com detalhes técnicos, como, por exemplo, roupas e maquiagem, mas deveriam criar, tendo como base o texto de Machado de Assis e as informações do conto, uma simulação de um júri popular.

Expliquei-lhes, ainda, que em uma situação de júri há uma espécie de ritual que deve ser seguido. Os advogados têm, cada um, sua hora certa para falar e podem protestar ao juiz quando se sentem ofendidos com as acusações do adversário. Em determinado momento, os advogados podem pedir a entrada das testemunhas para dar veracidade aos argumentos que utilizam para a acusação ou a defesa do cliente. Reforcei que os alunos deveriam ter em mente a figura de Vilela, como se este estivesse presente perante o tribunal, e que deveriam criar o texto pensando nos argumentos que utilizariam; disse também que o resto da sala teria a função do júri popular e, dependendo das argumentações expostas, daria o veredicto final ao juiz.

Senti que os alunos e a professora aprovaram a idéia e fizeram várias perguntas. Respondi dizendo que eles podiam usar a criatividade e criar situações a partir de elementos do texto. Apenas enfatizei que a peça não deveria ser muito longa, já que as apresentações seriam na semana seguinte e vários grupos se apresentariam no mesmo dia.

O resultado superou as expectativas. Os estudantes se empenharam em criar os roteiros e fizeram excelentes apresentações, conquistando a atenção do resto da sala. Acompanhando o desenvolvimento dos textos, percebi que os problemas de redação apareciam novamente, mas, por se tratar de um trabalho em grupo, eles eram corrigidos, em grande parte, pelos próprios alunos. Reforcei que, por se tratar de um diálogo que acontecia perante um “juiz”, eles deveriam tomar cuidado com as palavras utilizadas, tentando ser sempre o mais respeitoso possível. O objetivo foi fazer com que percebessem que a linguagem usada no computador ou em uma conversa informal era diferente da linguagem necessária em um contexto de formalidade. Os alunos não apenas compreenderam a diferença, como também redigiram excelentes roteiros e fizeram ótimas apresentações.

A atividade de “júri simulado” permitiu que os estudantes saíssem da rotina a qual estavam acostumados, fazendo com que todos trabalhassem em favor do grupo. Mesmo no momento das apresentações, a atenção de toda a sala foi conquistada e o clima saudável de competição colaborou para que os alunos se aplicassem e conquistassem o júri.

 

Reflexões

O período de estágio realizado na escola foi, sem dúvida, responsável pela transformação da teoria vista em sala de aula numa realidade prática e sensível, sem a qual a experiência do universitário se mostra incompleta. Não há como imaginar o que de fato ocorre dentro de uma classe sem ter estado presente nela e não há como formar um professor de qualidade sem que ele passe por esse período de ensinamento e aprendizado. O contato com os corpos discente e docente das escolas leva o aluno-estagiário da universidade a refletir sobre a situação em que se encontra o ensino da rede pública de seu país, além de lhe dar a oportunidade de sentir, na prática, até que ponto seus conhecimentos teóricos são aplicáveis à rotina de uma sala de aula.

Aquele que nunca teve contato com o mundo da escola pública pode se surpreender com o que vai encontrar. Muitas são as criticas feitas à rede de ensino, e não há como negar o fundamento da grande maioria delas; entretanto, ao ver de perto como as coisas realmente acontecem, percebi que nem tudo são problemas, já que a própria crítica faz uso de si própria e “os trabalhos buscam sua inscrição numa tradição e não a investigação com vistas à compreensão do fenômeno estudado” (BARZOTTO, 2004:245). Pensamento semelhante encontra-se na tese de Fernández (1994:107) que destaca a queixa como “lubrificante da máquina inibitória do pensamento”. A autora mostra como muitos professores usam a queixa para descrever ou para fazer uma suposta análise de sua realidade, mas o problema “consiste na crença equivocada de que se está usando o juízo crítico, de que se está pensando ou analisando a situação, quando somente se está convalidando a situação”, ou seja, a crítica, ao invés de ajudar, imobiliza. É o que acontece com a professora observada no estágio, pois ela sabe identificar os problemas que aparecem em sala de aula (a produção escrita precária, dois alunos analfabetos, a aula fastidiosa sobre classificações gramaticais), mas não faz nada para mudar essa situação preocupante; pelo contrário, ela critica sua própria condição como docente despreparada e subestima a capacidade dos alunos, sem nem ao menos tentar ou dar-lhes a oportunidade da tentativa.

Dá a impressão de que, muitas vezes, o discurso de crítica à escola e ao ensino público é um enunciado vazio e pouco se faz em favor da educação; é como se a enunciação estivesse vazia, dissociada dos seus sistemas de enunciado – nas palavras de Certeau (1996:253) “é a voz que ela não pode ser, mas sem a qual, no entanto, ela também não pode ser”. Traduzindo para o termo lingüístico, seria como se a crítica se apoiasse no discurso de outrem –aproveitando a classificação de Bakhtin (1988) – dissociado do seu contexto narrativo e de atuação; repete-se ad nauseam um discurso do qual não se sabe ao certo sua origem e fim, tampouco o lugar em que cabe sua transmissão.

Cada aluno é um indivíduo e, como tal, tem suas particularidades e seus limites, os quais deveriam ser respeitados. Deveriam, mas não o são. Talvez não por falha do corpo docente, mas por falha do próprio sistema de ensino que acredita ser possível haver ensino e aprendizagem numa sala lotada por mais de quarenta e cinco estudantes parece claro o quão difícil é para um único professor dar conta dos problemas de cada um de seus alunos, que não aprendem na mesma velocidade nem da mesma maneira, fato comprovado pela discrepância e heterogeneidade dos estudantes observados no estágio. É claro que alguns têm sua parcela de culpa por não se comportarem como deveriam, mas ainda é preciso entender se esse comportamento é pura falta de interesse, ou se há razões mais profundas por trás das atitudes de uma sala de aula que não se comporta de maneira satisfatória. E a atitude da professora observada dá pistas de onde se encontra a raiz de tamanha dificuldade.

O problema da produção de texto, abordado nas duas partes anteriores deste artigo, é constante fonte de queixa dos professores: os alunos não sabem escrever. E, como foi comprovado pelos exemplos dados, muitos deles realmente não o sabem; entretanto, encontram-se na oitava série do ensino fundamental. O incentivo à leitura, fundamental para o aprendizado da escrita, não está presente na sala de aula; quadros nas paredes lembram os alunos da importância da leitura, mas atividades que implicam de fato a leitura (seja ela de gibis, jornais e livros) não são realizadas com freqüência, privando-os do contato rico com a literatura por um grave pré-conceito. A biblioteca escolar está aberta a eles diariamente e conta com um excelente acervo de enciclopédias, livros e dicionários, porém, não há incentivo por parte dos professores.

Logo, um problema que deveria ter sido resolvido durante os primeiros anos de alfabetização persiste até a última fase da etapa que precede o Ensino Médio, o que certamente prejudicará os alunos que chegarem e esse ciclo escolar. Tal fato mostra como a queixa dos professores é favorecida, às vezes, e até promovida pela própria instituição educativa. O sistema de progressão continuada, que permite a repetência dos alunos apenas na quarta e na oitava séries parece ter piorado a situação. O que surgiu como uma tentativa de diminuir a evasão escolar – assim dito por muitos governantes e educadores – serve de máscara para o fato de que muitos estudantes seguem à próxima série sem terem realmente aprendido os conteúdos básicos necessários.

A intenção de tornar menor o número de alunos que desistem de completar o ensino fundamental por repetências contínuas é de fato louvável. Contudo, o sistema educacional não sofreu as reformas necessárias para a adoção de tais medidas, o que tornou a impossibilidade de repetir o ano algo que incentiva muitos jovens a não se preocuparem com os estudos, já que a passagem à próxima série está garantida por lei. Assim, alunos saem despreparados dos primeiros quatro anos do Ensino Fundamental II e chegam, muitas vezes, como é o caso de alunos da oitava série da escola na qual o estágio foi realizado, sem saber ao menos ler ou escrever.

 

Conclusão

Durante o período que passei na escola, tive liberdade para atuar como estagiário e muitas das aulas foram conduzidas de maneira a incentivar a participação e o interesse dos alunos pelo que estavam aprendendo. A atividade de júri simulado é um exemplo de como unir a sala de aula nos trabalhos em grupo que relacionam vários aspectos de uma só vez, como a leitura, a interpretação e a produção textuais, além de abrir as portas da dramatização àqueles que se interessam por ela.

A receptividade e a colaboração do corpo discente para a realização do estágio também não podem deixar de ser mencionadas. A grande maioria dos estudantes mostrou-se interessada e atenta às explicações, interesse refletido também, mas não unicamente, nas muitas notas altas por eles alcançadas, já que a atividade de júri simulado foi avaliada como a nota do bimestre. Para concluir, só me resta acrescentar que a experiência relatada neste artigo e no relatório de estágio contribuiu enormemente para minha formação como professor e só fez crescer a certeza de que, apesar dos muitos problemas que certamente terão de ser enfrentados, desistir não é a melhor opção.

 

Referências bibliográficas

BAKHTIN, Mikhail (1997). Marxismo e Filosofia da Linguagem. 8ª. ed. Trad. Michel Lahud et al . São Paulo: Hucitec.

BARZOTTO, Valdir Heitor (2004). Língua Portuguesa e prática docente: ouvindo vozes e tomando sustos. In: BASTOS, Neusa B. (org). Língua Portuguesa em calidoscópio. São Paulo: Educ/ Fapesp, pp. 239-245.

CANDIDO, Antonio (2004). Vários escritos. 4ª. ed. reorg. pelo autor. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul; São Paulo: Duas Cidades.

CERTEAU, Michel de (1996). A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. 2ª. ed. Trad. Ephraim F. Alves. Petrópolis: Vozes.

FERNÁNDEZ, Alicia (2004). A mulher escondida na professora. Trad. Neusa Kern Hickel. Porto Alegre: Artes Médicas.

    

Ler 21551 vezes

Deixe um comentário

Verifique se você digitou as informações (*) requerido onde indicado.
Basic código HTML é permitido.