Caminhos interpretativos: a tradição popular na sala de aula

 

 Bruna Atalla

 

Introdução

Este artigo baseia-se no relatório de estágio realizado no Colégio Anglo, unidade Tatuí, no Ensino Fundamental, em que eu conduzo as aulas de Leitura de 5ª a 8ª séries. A disciplina Leitura é oferecida aos alunos do Ensino Fundamental II e não é apostilada, cabendo ao professor a tarefa de montar o curso.

A escolha dessa escola se deu por dois motivos: em primeiro lugar porque eu poderia utilizar as horas do trabalho como horas de estágio. Em segundo, porque o curso de Leitura deste ano foi organizado por mim.

A partir disso, seria extremamente producente apresentar parte deste curso, uma vez que ele poderia ser avaliado por mim e pelo professor, o que abre a possibilidade de aprimoramento para os próximos semestres.

Sendo assim, neste trabalho, vou apresentar o conteúdo e elencar os aspectos positivos e negativos do curso, além de lançar sugestões de novas metodologias e novos materiais. É importante ressaltar que, a partir do segundo semestre, o curso de Metodologia fez com que eu alterasse algumas práticas e inserisse novos textos e métodos.

A série escolhida para este trabalho foi a 5ª série do Ensino Fundamental, pois foi a turma com a qual eu não obtive sucesso e que a prática em sala de aula foi muito difícil. Para a melhor compreensão do conteúdo da 5ªsérie, apresentarei também o plano de trabalho das outras séries, a fim de deixar explícita a continuidade do curso.

 

5ª série

Objetivos

•  Prazer pela leitura.

•  Perceber a ressemantização e a subversão de valores nos contos populares. Exemplos de contos: Contos de Grimm e Andersen, Chapeuzinho Amarelo (Chico Buarque), O Príncipe Desencantado (Flávio de Souza), Poesias e Jogos Dramáticos.

Livros sugeridos

•  Pobre Corintiano Careca, Ricardo Azevedo;

•  Bisa Bia, Bisa Bel, Ana Maria Machado;

•  A Bolsa Amarela, Lygia Bojunga Nunes;

•  O Saci, Monteiro Lobato.

Obs: Os textos serão distinguidos como ficcionais e não-ficcionais. Será, entretanto, feita uma breve discussão sobre o gênero Novela.

 

6ª série

Objetivos

•  Compreender os elementos da narrativa ficcional a partir de contos e começar a refletir sobre gêneros discursivos.

Livros sugeridos

•  O Signo dos Quatro, Sir Arthur Conan Doyle;

•  Alice no País das Maravilhas, Lewis Carrol;

•  20 mil léguas submarinas, Júlio Verne.

 

7ª série

Objetivos

•  Fazer os alunos atentarem às coerções genéricas, isto é, às regras a que os textos se submetem e de que forma, muitas vezes, elas são desestabilizadas.

Livros sugeridos

•  Um Sonho no Caroço do Abacate, Moacyr Scliar;

•  Um Estudo em Vermelho, Sir Arthur Conan Doyle.

 

8ª série

Objetivos

•  Percepção da heterogeneidade discursiva, principalmente das intencionais, como a intertextualidade.

Livros sugeridos

•  A Metamorfose, Franz Kafka;

•  A Revolução dos Bichos, George Orwell;

•  Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley.

Para escolher os livros de cada série, baseei-me no PNLD de 2004, no site da editora Ática e no site Educarede, que indicam livros para cada série. Embora as datas do estágio sejam do segundo semestre, e as matérias registradas de fato coincidam com este período, será essencial para este relatório valer-se de dados do primeiro semestre.

 

Relatório de Observação e Regência

5ª série do Ensino Fundamental

Eu tenho três preocupações com a 5ª série. A primeira é de conquistá-los, pois eu ainda não os conheço. A segunda é de mostrar que ler é prazeroso. E a terceira é conciliar prazer e dever, sem banalizar o curso. Este, portanto, tem de ser divertido e sério ao mesmo tempo. A priori, com os textos que eu havia selecionado, achei que seria tarefa fácil, pois assim o foi no ano passado. A minha ingenuidade, porém, residiu no fato de eu me esquecer de que os públicos variam. E a diferença entre a 5ª série do ano passado e essa 5ª eram gritantes.

O primeiro dia que entrei na sala de aula, já tive um estranhamento, pois eu entrei na sala entre objetos voando de todos os lados. Meninas gritavam histéricas e meninos corriam para todos os lados com as vozes não menos baixas que as das meninas. Tinha certeza de que eu conteria a sala, mas o trabalho foi difícil todo o ano.

 

04/02/04

Fiz a minha apresentação, passei os avisos sobre avaliação e materiais e fiz a seguinte dinâmica:

•  Dividi a turma em grupos.

•  Cada grupo deveria fazer perguntas e tarefas para o outro realizar.

•  A surpresa é que a tarefa criada deveria ser realizada pelo próprio grupo criador.

•  O objetivo era mostrar que deveria haver cooperação entre eles. Que era essencial que todos se ajudassem quanto a materiais e dificuldades que tivessem em relação à matéria.

O resultado foi o pior possível. Todos criaram atividades com o intuito de colocar o outro numa situação de constrangimento. Quando eu os informei quem era que deveria realizar as tarefas, a revolta foi grande. E a gritaria também.

O resultado da segunda dinâmica não foi melhor, mesmo depois de eu ter conversado com eles em relação à cooperação. A dinâmica era a seguinte:

•  Todos deveriam sentar em círculos em suas carteiras.

•  Cada um com uma folha de sulfite colocaria o próprio nome no topo.

•  As folhas iriam sendo passadas ao colega ao lado para que estes deixassem recados.

Houve muitas ofensas entre eles e, a partir dali, já era claro: a sala não era unida e era extremamente indisciplinada, no conceito mais amplo que disciplina possa assumir.

A última brincadeira foi com um poema do Sérgio Caparelli, O Buraco do Tatu. O objetivo era criar os três últimos versos, a partir dos primeiros: O Tatu cava um buraco/ Um buraco muito fundo... Não foi um trabalho de improvisação, eles tiveram tempo para elaborar. E nesse tempo, a dependência dos alunos foi grande em relação a mim. Queriam saber se estava certo, se estava bom, se não estava errado. Frases como: “Eu não consigo” ou “estou com dificuldade”, foram extremamente comuns. Como se de fato eles achassem que seriam punidos caso fizessem errado, ou feio. Aliás, em todas as séries, foi uma dificuldade fazer os alunos se soltarem, pois eles parecem estar sempre agindo sob um olhar punitivo de bronca ou de nota.

Em todas as atividades propostas, eles perguntavam se valia nota. E se eu dizia que valia, eles entravam em pânico. É provável que eles tenham sido habituados assim ao longo da vida escolar. Isso é positivo em muitos aspectos, em outros, entretanto, fica claro que o aluno se torna inseguro com suas próprias idéias.

Voltando à atividade: os alunos se sentaram em círculo e cada um leu o verso criado. Eu fazia com que batessem palmas a cada leitura. Como são muito falantes, a dificuldade encontrada foi fazer a leitura fluir, isto é, fazer leitura- palmas- leitura. Para o outro começar era necessário um tempo até que a roda fizesse silêncio. E obviamente, havia sempre um aluno que criticava a criação do outro.

As aulas que continuarei relatando abaixo estão organizadas em forma de tópico. A grande questão é: o que colocar na lousa? Eu não sabia. Eu preparava a aula e quando discutia com eles alguns aspectos observava aquilo que era necessário “mandar copiar” e o que não era. Errei nesse sentido no meu ponto de vista. Primeiro porque isto dá a impressão de que a aula não foi preparada. Segundo porque algum aluno sentado ali no fundo, que não participou da discussão e eu que não observei, pode ter a necessidade de um tópico na lousa que os outros alunos não têm.

Dessa forma, creio que o ano que vem as aulas devem ser preparadas por mim de modo que esteja esquematizado no papel o que colocaria na lousa.

 

11/02/05

Distinguir dois tipos de história: - real ou - irreal ® ficcional

Perguntei à sala de que língua havia se originado o português ao que todos responderam em uníssono: “do latim”. Assim, fiquei à vontade para explicar:

•  Fingere> fingir> ficção, para explicar que a ficção é um fingimento.

•  Leitura de uma ficção: No dia em que o gato falou, Millôr Fernandes.

•  A leitura será feita pelos alunos em voz alta e em seguida por mim.

-Discussão oral sobre o texto:

•  Pedir que alguém faça um comentário aleatório.

•  Pedir que reflitam sobre expressões idiomáticas e digam se conhecem a origem.

•  Refletir sobre os perigos da experimentação. Lembrar da lenda urbana (?) do gato no microondas.

•  Por que o autor colocou nas notas de rodapé “Construção do Estado?”

•  Discutir a moral da história, pedir outros exemplos e fornecer-lhes outros.

A discussão foi produtiva, embora tenham existido dificuldades para ouvir a pessoa que estava comentando, pois enquanto um estava falando, outro estava atirando giz. Ao longo do tempo, percebi que quatro alunos na sala faziam uma diferença muito grande. Quando eles, ou um deles não estava, a aula fluía tranqüilamente.

Certa vez assisti a uma palestra de um ator-professor (como ele se auto-intitulava) que falou sobre uma peça teatral em que uma atriz foi substituída por outra. O resultado foi que em uma determinada cena com a atriz anterior as pessoas choravam, e com a substituta eles riam. Utilizou esse fato para exemplificar o que acontece na sala de aula quando se mexe em uma única peça: a aula fica diferente. Recentemente, passei por isso: assisti a uma peça duas vezes. Na segunda vez, uma única atriz tinha sido modificada e o entrosamento entre os atores foi bem diferente.

Era o que acontecia nessa sala. Desses três alunos que modificavam a produtividade da minha aula, um mudou de escola; e os outros dois ficarão para conselho. Provavelmente vão repetir o ano.

•  Tarefa em sala de aula: enumerar palavras desconhecidas no caderno e procurar no dicionário. Ao final vistei o caderno de todos.

 

18/02/05

Atividade de Interpretação

Conto: No dia que o gato falou (Millôr Fernandes)

Disciplina: Leitura

•  No excerto “Manso e inteligente, seu olhar era humano”, do primeiro parágrafo, o autor insere uma nota de rodapé. O que você acha que o autor quis dizer com essa nota?

•  Observe, no terceiro parágrafo, o trecho “O papagaio viu no brilho do olhar da dona o seu (dele) terrível destino e tentou escapar. Por que você acha que o autor colocou o pronome (dele) entre parênteses?”.

•  O papagaio do conto, segundo Millôr Fernandes falava pelas tripas do Judas. O autor ainda acrescenta nas notas que “ninguém sabe de onde veio essa expressão”. Enumere três expressões que você conhece e que também não imagina de onde vem.

•  Por que você acha que o autor disse que o prédio que desabou é uma construção do Estado?

•  Explique a moral da história, relacionando-a com o texto. Você conhece alguém que não acredita em suas próprias criações?

A questão que apresentou maior dificuldade foi a primeira. Quase ninguém conseguiu responder. Não perceberam a comicidade da nota, provavelmente porque ainda não houve reflexão sobre o comportamento dos homens. Na questão três, eles também apresentaram dificuldades por não se lembrarem ou talvez por não possuírem repertório cultural suficiente.

 

04/03/05

•  Leitura do Príncipe Desencantado, do Flávio de Souza.

- Discussão: O texto dramático (explicar que este é um texto para ser encenado e que encenar é dramatizar).

•  No texto dramático existe o narrador?

•  O que substitui o narrador?

•  Quem sabe a diferença entre discurso direto e discurso indireto?

Discurso direto: quando a personagem fala.

Discurso indireto: quando o narrador conta o que a personagem falou.

 •  O texto dramático possui discursos diretos ou indiretos? Por quê?

•  Como não existe mais narrador, como sabemos o que se passa com as personagens?

•  Explicar Rubricas:

As rubricas são indicações das ações e sentimentos das personagens e de elementos do cenário. Dessa forma o ator pode se orientar, isto é, saber o que ele deve fazer.

•  Em seguida os alunos fizeram a leitura dramatizada dessa peça. Todos gostaram muito da atividade. Um grupo de alunos se dispôs a decorar e a encenar a peça, três semanas depois. Providenciaram o figurino, cenário e ampliaram algumas falas.

•  A paródia: é uma imitação cômica. Exemplo de músicas que eles inventam a partir de outras. Entreguei a eles também “Ai que Saudades”, de Ruth Rocha e “Meus Oito Anos”, de Casimiro de Abreu, a fim de mostrar outro exemplo de paródia.

 •  Estereótipo: é uma imagem fixa e inalterável. Exemplo do CDF.

Atividade proposta (no caderno)

•  Qual conto de fadas é parodiado em O príncipe desencantado?

•  Os estereótipos das personagens dos contos de fadas foram mantidos ou subvertidos?

•  Como se chama a descrição dos sentimentos, movimentos e reações das personagens no texto dramático?

•  As personagens e suas ações estão adequadas à época em que se encontram?

 

01/04/05

A Poesia

•  Vocês sabem o que é um acróstico?

•  Ler acrósticos.

O que mais vou querer?

Para auxiliar na produção de acróstico, fizemos a seguinte atividade:

•  Levantamento de características físicas psicológicas, positivas e negativas.

•  Levantamento alfabético relacionado às características elencadas.

•  Atividade: Fazer um acróstico homenageando um colega.

A atividade foi produtiva, os alunos gostaram muito e toda aula, quando eu entrava, tinha um acróstico com o meu nome na lousa.

Mais poesia

•  Ler Bão balalão e mostrar a versão musicada do Secos e Molhados.

•  Em seguida, ler O açúcar, Ferreira Gullar.

•  Qual a diferença entre os dois poemas?

Muitos responderam que “um rimava e o outro não”.

A partir disso comentei que esse poema sem rimas contava fatos e que, portanto ele tinha um caráter narrativo, sendo possível fazer uma paráfrase.

Atividade: Vamos parafrasear O Açúcar?

•  Parafrasear é contar com suas próprias palavras. Sendo assim, quando parafraseamos um texto, obtemos uma paráfrase.

A dificuldade encontrada pelos alunos foi se desvincular das palavras utilizadas pelo autor. Normalmente, eles escreviam ipsis litteris. Por esse motivo pedi para que refizessem a atividade substituindo as palavras que eu destaquei.

 

15/04/05

•  Retomei a aula passada: estereótipo, paródia, poesias.

•  Bronca sobre o comportamento das aulas anteriores:

•  Não prestam atenção ao que foi proposto.

•  Como chegarão na 6ª série?

•  Algumas atividades são trabalhosas, mas os resultados são sempre gratificantes.

•  Lembrar o teatro feito por eles: foi trabalhoso, mas o resultado foi excelente.

•  A sala fez silêncio e pareceu ter acatado. Quando propus a nova atividade, entretanto, foi como se eu não tivesse falado nada. Tive um sentimento de impotência.

•  Atividade do dia: Jogo Dramático (as regras estão na ficha em anexo).

•  Pedi para que eles escrevessem a história em grupo e em seguida dramatizassem.

A principal dificuldade foi não atender ao que foi proposto. Esse fato foi recorrente ao longo do curso e, na maioria das vezes, isso não representou incompetência de leitura, como demostram outras atividades que eles realizaram. Ao contrário, foi desatenção e desinteresse.

Isso mostra que o meu projeto de sedução no primeiro semestre fracassou. Até agora encontrei o problema da desorganização da lousa, o que representa uma falha da metodologia. Seria só isso? Os alunos gostam de mim, os textos são interessantes do meu ponto de vista e de autores de livros de didáticos, mas a aula não é producente.

A partir desse ponto vale uma observação. O meu curso é o único que não é apostilado, não tem a famosa PE (prova específica) e os alunos não sabiam (descobri recentemente) que eu elaboro questões para a temida PI (prova interdisciplinar). Mas por que só com essa sala? Seria então um problema de clientela aliado ao problema de metodologia e do caráter informal do curso? Creio a priori que seja isso.

 

A coordenadora me chama para uma conversa

A minha coordenadora, professora de Geografia do Ensino Fundamental me chamou para termos uma conversa. Segundo ela, os alunos estavam indo mal na Prova Interdisciplinar porque não sabiam interpretar texto e isso era responsabilidade minha. Na hora, eu fiquei abalada psicologicamente, com um imediato sentimento de culpa e respondi que, “tudo bem, ia pegar no pé com interpretação”.

Mais tarde parei para pensar. Achei estranho porque, muitas vezes, os alunos me surpreendiam, ao fazer inferências que apresentavam certo grau de dificuldade. Além disso, como duas aulas de Leitura semanais poderiam resolver o “problema de interpretação?” E, porque eu era a única da área de Língua Portuguesa que recebia a culpa? E o professor de Gramática, que inclusive tem uma frente de Leitura em sua apostila?

Em seguida, fui pedir auxílio da professora da área de Língua Portuguesa no quesito interpretação. Expus o fato e a minha reflexão sobre ele. Ela esteve na reunião em que coordenadora disse: “Eu sei que a culpa é da Bruna” e disse que ela “arrepiou os cabelos” e acrescentou que “a responsabilidade é de todas as matérias”.

De qualquer modo, ela me aconselhou a trabalhar com textos mais denotativos. Na minha ânsia de atender às necessidades do Colégio, entrei na internet e selecionei uma notícia para cada série. O critério era “graus de inferência”. Escolhi para a 5ª série um texto com as informações explícitas, na maioria das vezes, como forma de diagnóstico.

 

06/08/05

Revisão e Dinâmica

•  Distinguir dois tipos de história › real e irreal

•  Nome que damos à história irreal › ficcção>fingere>fingir

•  Enumerar tipos de histórias ficcionais e não-ficcionais. Enumerar em que tipos de textos essas histórias são contadas.

•  Ficcionais: romance, conto, fábula, novela, teatro etc.

•  Não ficcionais: notícia, reportagem, relato de experiência, entrevista, etc.

•  Mostrar gêneros diferentes e pedir para que os alunos identifiquem. Fazer perguntas para alunos menos atenciosos.

•  Qual o gênero que a gente mais leu?

•  Características do gênero dramático:

•  O narrador dá lugar à voz das personagens;

•  O discurso, portanto, é direto;

•  O próprio nome da personagem marca a sua fala;

•  Aparecem as rubricas.

•  Vimos, em seguida, textos dramáticos parodiados. O que é paródia?

Segundo o dicionário Aurélio: Paródia s.f.imitação cômica de uma composição literária. 2.P;extensão. Imitação burlesca.

•  Como foi a paródia que vimos?

•  Foi uma paródia da Bela Adormecida. Qual era nome?

•  O Príncipe Desencantado desconstruiu vários estereótipos? O que é estereótipo?

•  Estereótipo é uma imagem fixa e inalterável.

•  Mostrar Monalisa.

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 Com perguntas estimuladoras à sala, cheguei à conclusão junto com os alunos de que:

•  As duas fotos representam uma paródia de Monalisa, de Leonardo da Vinci.

•  A “Monalisa” à direita é o estereótipo da mulher americana, fato observado a partir do título (Monalisa after one week in U.S.A), dos cabelos loiros, e os bustos grandes.

•  A “Monalisa americana” subverteu as formas da “Monalisa original”.

Essa revisão foi muito importante, pois reforçou alguns conceitos fundamentais do primeiro semestre. Alguns alunos que não haviam compreendido anteriormente compreenderam nessa aula.

•  Indicar o livro: Pobre Corinthiano Careca, do Ricardo Azevedo e pedir para que me esperem avisar o dia que chegará à livraria.

•  Propus no final da aula uma dinâmica a fim de introduzir o conceito de Literatura oral ou literatura popular.

 

A dinâmica

•  Todos em pé formaram um círculo. Um aluno ficou no meio com uma bolinha na mão. O aluno do centro deveria dizer uma frase jogar a bola para alguém do círculo. Quem pegasse a bola deveria recontar a frase do outro e acrescentar.

Depois que todos se sentaram eu expliquei (e coloquei na lousa) que Literatura Oral (ore>grego>boca) é aquela transmitida de boca em boca, de geração em geração. Por exemplo, um pai conta para o filho, que conta para o filho e assim sucessivamente. O objetivo da dinâmica era mostrar que com as histórias de tradição oral acontecia parecido com o que aconteceu na brincadeira: quando a história vai passando de boca em boca, um aumenta, outro diminui, outro modifica. Dessa forma, a mesma história pode ser contada de várias maneiras diferentes, preservando apenas o tema principal.

 

14/08/05

•  Fiz uma leitura com os alunos de um conto de tradição oral chamado “O Diabo e o Granjeiro”, da Tatiana Belinki, para ilustrar a atividade da aula passada.

•  Expliquei que essa é uma história de tradição oral que foi recontada por uma escritora.

•  Além disso, acrescentei que se outro autor a tivesse escrito, poderia ter feito diferente de acordo com seu estilo, obviamente, preservando-se a idéia principal.

Na seqüência da aula, saí da literatura oral para analisarmos o conto “O menino e o velho” da Lygia Fagundes Telles.

•  Leitura de um conto da Lygia Fagundes Telles será feita por eles em voz alta e em seguida por mim, esclarecendo nesse processo as dúvidas vocabulares.

•  Atividade proposta: Parafrasear o conto.

Eu sempre me preocupo em fazer a leitura oral por dois motivos: primeiro para que os alunos observem o tom adequado da leitura (sinistro, alegre, duvidoso) e percebam como a leitura se torna mais interessante e gostosa quando a leitura é bem feita. Além disso, enquanto eu faço a leitura, faço alguns gestos, como por exemplo, na hora em que o velho arruma o colarinho. Acho que isso mostra como eu estou inserida naquele mundo fictício e como isso é prazeroso.

Os alunos precisam perceber que o professor realmente gosta e acredita naquilo que está fazendo. Mesmo que às vezes eu tenha que fingir que estou gostando, considero isso um primeiro passo para que o aluno também se interesse pelo conteúdo.

Isso eu observei através dos meus professores e também através da minha prática em sala de aula. Uma das situações se deu no dia em que eu li esse conto, três alunos muitos indisciplinados faltaram. Os que ficaram aproveitaram muito a aula e entraram no clima da leitura.

 

A paráfrase

Infelizmente não fiquei com as atividades das paráfrases, mas da minha correção, o que lembro e que vale ressaltar foi a extrapolação dos alunos. Muitos disseram que o menino matou o velho porque ele (o menino) era muito mal. Outros até disseram que o velho espancava o menino. Essas extrapolações, entretanto, não foram realizadas de forma positiva, pois não havia no texto nenhum dado que as justificasse.

O termo extrapolação que eu estou utilizando, deve-se a alguns conceitos apreendidos na aula de Metodologia II. Segue abaixo.

 

Pressupostos para uma leitura adequada (pois a leitura errada existe):

•  Conhecimento de mundo/leitura de mundo

•  Conhecimento lingüístico ® do código, da gramática (figuras de linguagem).

•  Conhecimento discursivo ® autoria

 

Níveis de leitura:

•  Fragmentário, Parafrástico, Global e Extrapolativo.

A partir disso foi possível observar mais claramente através dos equívocos dos alunos, qual o tipo de conhecimento estava faltando. Na verdade, esses conceitos norteavam as minhas atividades propostas e correções das atividades, entretanto, eu não as tinha claramente organizadas na minha cabeça.

•  Depois da paráfrase, passei questões interpretativas sobre o conto:

•  No primeiro parágrafo, a autora estabelece dois paradoxos (idéias contrárias) quando se refere ao mar.

•  Quais são esses paradoxos?

•  O que você acha que a autora quis dizer com eles?

•  A narradora desse conto passou o tempo todo observando o menino e o velho. Essa narradora é apenas observadora ou é também onisciente, isto é, sabe o que se passa na mente das personagens?

•  Segundo o texto, nós podemos inferir que o menino trabalha? Se sim, qual a sua profissão mais provável?

•  Quando a autora narra “Pão Preto? Ele lembrou...” você acha que quem lembrou o quê?

•  Releia o primeiro e o segundo parágrafo e escreva todas as características que explicitam as diferenças sociais entre o menino e o velho.

•  A casa do ator de cinema a quem a autora compara o velho era alegre ou sinistra? Descreva essa casa.

•  O que o narrador diz que pode nos dar pistas sobre o caráter do velho?

•  Quando o narrador reencontrou os dois protagonistas (personagens principais), houve algumas transformações nessas personagens?

•  No antepenúltimo parágrafo a narradora volta a falar do filme. Qual você acha que foi a intenção da autora?

•  Faça uma comparação entre as imagens que a narradora compôs do mar entre o primeiro e o último parágrafo.

 

Os Contos Populares

Um professor forneceu-me uma apostila organizada por ele: “Coletânea de textos extraídos da tradição oral”, da qual pude aproveitar em minhas aulas uma série de elementos da Literatura Popular.

Comecei pelas adivinhas, trava-linguas e provérbios, propondo atividades relatadas na aula seguinte.

Nas aulas posteriores li diversos contos folclóricos da apostila, comentando que a lenda ou o mito tentam explicar o que é inexplicável e que acabam se tornando sabedoria popular.

 

26/08/05

Propus uma gincana com as adivinhas, na tentativa de fazê-los participar da aula. De fato participaram, mas deflagrou-se uma guerra entre os grupos. Um queria ser melhor do que o outro, acarretando uma disputa nada saudável com direito a ofensas verbais e físicas (sim, físicas). Relato a atividade a seguir:

•  Dividi a sala em cinco grupos.

•  Cada grupo deveria ler a adivinha para outro grupo, que arriscaria a resposta certa.

Alguns acertaram as adivinhas mais fáceis. Houve reações de estranhamento quando eram reveladas a eles respostas que nem imaginavam. Comentários como “nada a ver!” foram muito freqüentes como na adivinha abaixo, cuja resposta é relógio.

Um palácio tem doze damas

Cada dama tem quatro quartos

Todas elas usam meias

E nenhuma usa sapatos

Obviamente, os alunos passavam a ver sentido, depois de estabelecidas todas as comparações, para se chegar à resposta correta. Em seguida, com os mesmos grupos formados propus uma atividade com trava-línguas. Quem travasse a língua perderia ponto.

Os alunos se divertiram e, dessa vez, foi mais tranqüilo, pois eles precisavam fazer silêncio para verificar se o outro grupo não ia se enroscar.

A atividade seguinte foi com provérbios. Digitei todos os provérbios da apostila e cortei-os pela metade como ilustrado abaixo:

A caixa menos cheia É a que mais chocalha

A galinha da vizinha É mais gorda que a minha

•  Cada um deveria ficar com uma parte e achar o seu par.

Alguns sentiram dificuldade, pois não acreditavam que a sua metade era a metade do outro como em: Água fria/ Não escalda pirão. Esse estranhamento se deu, provavelmente, pela ausência de rimas e também por nunca terem ouvido falar.

Sempre que propunha essas atividades, dizia a eles que se tratava de tradição oral, ou seja, do que é transmitido de boca em boca. Mas , o que me deixava mais deprimida era quando eu perguntava na aula seguinte o que era tradição oral, eles não sabiam responder.

Imaginei que talvez tivessem faltado exercícios de fixação. Mas como, com exercícios teóricos, tornar agradável uma atividade que pode ser tão produtiva e prazerosa sem os mesmos?

 

O Cordel

A Literatura de cordel encaixou-se perfeitamente no tema que eu estava desenvolvendo: literatura popular. Utilizei um livro intitulado “O Cordel na Sala de Aula” que fornece alguns dados sobre essa literatura e fornece algumas metodologias.

A questão enfatizada pelo livro é que não se deve teorizar sobre o cordel, mas tentar promover um encontro afetivo entre o aluno e essa literatura.

 

14/10/05

Antes do início da aula, coloquei varais na sala e prendi os cordéis com pregador. Isso despertou a curiosidade deles, Eles olhavam, abriam, perguntavam o que era e até riam com alguns versos lidos aleatoriamente.

Com os cordéis pendurados corrigi exercícios da aula anterior e na aula seguinte falei dos cordéis como quem conta uma historia informalmente. Depois, chamei alguns alunos para escolherem um cordel e lerem para a sala. Pedi para eles pegarem “As proezas de João Grilo”, que poderia gerar mais riso na sala.

A leitura, no início, foi um pouco truncada, pois os alunos não sentiam o ritmo dos versos. Por isso, fiz questão de ler alguns trechos.

 

A Expo-Anglo

O colégio Anglo promove todos os anos uma exposição temática em que cada professor deve relacionar a sua matéria a um tema proposto. O tema de 2005 foi água, então tive a oportunidade de aproveitar o cordel para discutir a questão da seca.

Dessa forma, levei na aula seguinte, em transparência “A Triste Partida” e “O ABC da Seca, Patativa do Assaré, para que pudéssemos ler e discutir.

Depois de ler e parafrasear parte do poema, conversei com os alunos sobre a temática da seca. Chegamos juntos à conclusão de que é natural que a seca seja bastante abordada no cordel, já que ele se instalou na região Nordeste e sua prática mais comum se dê exatamente nessa região.

O que eu tentei deixar claro é o caráter não científico da espera pela chuva, pois normalmente a questão da seca na literatura de cordel é atribuída não a algo natural, mas como sendo um castigo de Deus.

Com a ajuda da professora de Educação Artística, eu e os alunos montamos uma sala de Literatura de Cordel, abordando a questão da seca e da religiosidade. As paredes da sala foram cobertas de papel craft, para representar a região seca e cordões com os livretos pendurados preenchiam o alto da sala. Havia uma televisão em que as pessoas podiam assistir ao “Lunário Perpétuo”, show de Antonio Nóbrega, e painéis com a historia do cordel e com a biografia de Patativa do Assaré.

Na parede, sobre o papel, os alunos fizeram desenhos e escreveram frases relacionadas à seca.

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O resultado da exposição foi muito positivo, pois os alunos das outras series fizeram muitas perguntas durante a montagem e ficaram muito curiosos com os folhetos e com o vídeo.

No dia da exposição, aberta ao publico, os alunos se revezaram para fazer a monitoria da sala, principalmente os que não eram da 5ª serie. Alguns pais também se mostraram bastante curiosos, pois nunca tinham visto um folheto de cordel.

Na aula seguinte, conversei com os alunos sobre o cordel e poucos sabiam falar a respeito, então, caindo no desaconselhável tecnicismo, apliquei uma atividade com perguntas sobre a história do cordel e a relação entre a seca, o cordel e a religião.

 

22/10/05

O Cordel, pela sua composição, é intrinsecamente ligado à música, por isso pesquisei algumas canções famosas a partir de cordéis. As que encontrei do Luiz Gonzaga, não agradariam meu público, provavelmente, e a minha situação não estava boa para arriscar a chocá-los, ou pior, enfadá-los. Então, levei uma peleja do Caju e Castanha que era possível que eles gostassem por se tratar de um tema atual.

Expliquei e coloquei na lousa o que era uma peleja (muito comum nos cordéis) em seguida coloquei para eles ouvirem uma peleja da dupla. Aproveitei a ocasião para relembrar os trava-línguas, colocando a musica “Duvido você dizer”, dos emboladores.

Os meninos, principalmente, gostaram bastante e até criaram versos uns para os outros. Algumas meninas torceram o nariz e me disseram: “Bruna, você é louca, cada coisa que você traz!”

 

04/11/05

O Teatro

Nesse dia, levei as crianças a São Paulo para assistirmos a peca “Avoar”, do Vladimir Capella. O objetivo era fazê-los refletir sobre a cultura popular, a oralidade e sobre suas vidas. Queria que eles refletissem em que tipo de ambiente eles estavam inseridos e o que eles esperavam para eles.

A peça faz parte do Projeto Escola do grupo Silvio Santos, é indicada para todas as séries do Ensino Fundamental. Ao final da peça, todos os alunos recebem um livreto intitulado “Caderno do Aluno”.

 

11/11/05

Esse seria meu último dia de aula com os alunos e eu tinha um peso sobre as minhas costas, pois tinha fracassado com eles. Senti vergonha diante deles e senti vergonha diante de mim, mas fingi empolgação, como sempre.

Na aula seguinte, os alunos fariam atividade para nota, então utilizei essa aula para conversarmos sobre a peça e sobre o livro, a partir dos quais eles fariam uma atividade na aula seguinte.

 

Conclusão

Tentei ilustrar de forma sucinta o decorrer do curso de Leitura da 5ª serie do Ensino Fundamental. O objetivo desse curso foi o encontro do aluno com a literatura popular, muitas vezes legado ao segundo plano em termos de Literatura.

O primeiro semestre consistiu em uma tentativa de sedução dos alunos, isto é, uma tentativa de conjugar leitura e prazer. A literatura popular, entretanto, teve maior expressividade no segundo semestre.

O grande problema encontrado nesse curso foi o da metodologia, que não foi muito bem definido por mim e também pelo fato de eu não ter sabido ambientar os alunos antes do contato com determinados textos.

Creio que as reflexões feitas por mim ao longo do ano e durame esse trabalho servirão de subsidio para a montagem do curso no próximo ano.

 

Referências bibliográficas

LUCIO, Ana Cristina Marinho & PINHEIRO, Helder. Cordel na Sala de Aula. Livraria Duas Cidades, 2001.

OLIVEIRA, Alberto. Setao Despedaçado. Coqueiro, s/d.

ENSINAR E APRENDER, LNGUA PORTUGUESA. Vols. 1,2 e 3. Material fornecido pela secretaria da Educação e elaborado pelo CENPEC.

Sites:

www.educarede.com.br

www.atica.com.br

www.odialetico.hpg.ig.com.br

 
  
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